A Virtude da Fortaleza: A coragem serena de perseverar no bem

Há alguns dias, vivi uma cena comum na vida de quem é mãe. A Rafaela, minha filha de três anos e meio, recusava-se, com toda a convicção que sua pouca idade permitia, a comer cenoura refogada no jantar. Ela empurrava o prato, dizia “não” com firmeza e se encolhia como se aquilo fosse uma grande injustiça. Quem é mãe sabe como essas pequenas batalhas acontecem com frequência.

Mas, aqui em casa, temos um lema que repito sempre: não estou criando minhas filhas para mim, mas para o Céu. E, por isso, as pequenas ocasiões do cotidiano são oportunidades para ensinar algo maior, algo que transcende a simples refeição ou o ato de obedecer por obediência.

Eu me abaixei, olhei nos olhos dela e disse:
“Querida, a mamãe quer te ensinar a ser forte. Não só de muque, mas para tudo o mais que a vida vai te mostrar. Vamos começar por esse pedacinho pequeno aqui?”
Ela me olhou, ainda desconfiada, mas aceitou. E depois de provar a cenourinha, sorriu: “Ah, era gostosa!”
E comeu mais um pedacinho.

Parece pouco, mas ali estava sendo semeada a virtude da fortaleza.

O Que é, de Fato, a Fortaleza?

Segundo São Tomás de Aquino, a fortaleza é uma das quatro virtudes cardeais. Ela não se limita ao ato heroico de quem enfrenta perigos físicos ou grandes tribulações. Antes de tudo, é uma disposição interior, uma constância firme para buscar o bem e resistir ao mal, mesmo quando isso exige sacrifício e perseverança.

Ele explica, na Suma Teológica, que a fortaleza não é a virtude daquele que não sente medo, mas daquele que, apesar do medo, permanece fiel ao que é justo e verdadeiro. Ela combate tanto a temeridade (agir sem prudência) quanto a covardia (fugir por medo).

Viktor Frankl, ao descrever a condição humana nos campos de concentração, dizia que há um reduto último e inviolável em nós: a liberdade de escolher nossa atitude diante das circunstâncias. Essa é a alma da fortaleza. E é exatamente isso que ensino às minhas filhas. Não se trata apenas de comer ou não cenoura, mas de formar uma vontade que escolhe o bem, apesar do desconforto, do cansaço ou da preguiça.

Fortaleza Para as Grandes e Pequenas Batalhas

Muitas vezes pensamos na fortaleza como algo reservado aos mártires, aos heróis da fé, àqueles que enfrentam perseguições, doenças terminais ou grandes injustiças. E é verdade que nessas ocasiões a fortaleza brilha com força.

Mas é no cotidiano que ela se constrói:

  • Nas pequenas renúncias,
  • Na decisão de ser fiel a um compromisso, mesmo sem vontade,
  • No esforço de manter a serenidade diante de uma contrariedade doméstica,
  • No não reclamar quando o cansaço bate,
  • No silenciar uma crítica impaciente ao marido,
  • Ou na decisão firme de levantar-se cedo para rezar ou trabalhar.

São Francisco de Sales nos lembra que “a santidade consiste em fazer as pequenas coisas com grande amor”. E a fortaleza é precisamente o que nos sustenta nessas pequenas decisões diárias.

Por Que Perseverar?

Porque amamos.
E o amor verdadeiro não é passional ou instável. Ele se apoia no Amor eterno, que venceu até a morte, como nos lembra Cristo Crucificado.
A fortaleza é sustentada por esse amor maior. Ela não é simplesmente uma força nossa, mas um dom que se desenvolve à medida que reconhecemos nossa fraqueza e abrimos espaço para a graça de Deus.

Como diz São Josemaria Escrivá, “não há paz sem luta”. E a fortaleza nos dá precisamente essa coragem tranquila de persistir no bem, mesmo quando não sentimos vontade, mesmo quando ninguém nos vê, mesmo quando estamos sozinhas.

Como Conquistar a Virtude da Fortaleza?

Fortaleza não se conquista do dia para a noite, nem como um talento natural. É uma virtude moral e, por isso, exige treino, hábito, perseverança. São Tomás de Aquino diz que a virtude se adquire com o exercício repetido de atos bons.

Aqui vão algumas práticas recomendadas por ele e por outros mestres espirituais, como São Josemaria Escrivá e Padre Francisco Faus:

1. Fortaleça Sua Vontade

  • Comece a dizer pequenos “nãos” a si mesma.
  • Não pegue imediatamente o celular; espere um minuto.
  • Faça uma oração de agradecimento antes de começar a comer.
  • Sente-se direito ao trabalhar ou rezar.
    Estas pequenas mortificações formam uma vontade mais firme e uma disposição para o sacrifício quando for necessário.

2. Seja Fiel às Suas Convicções

  • Faça um exame de consciência regular.
  • Pergunte-se: “Estou sendo fiel ao que acredito, ou me deixando levar pelo comodismo e pelo medo de desagradar os outros?”
  • Como dizia São João Paulo II, “não tenhais medo” de ser coerente, mesmo quando for difícil.

3. Enfrente Seus Medos

  • Não fuja das conversas difíceis com seu marido.
  • Não adie decisões importantes.
  • Encare pequenos desafios que você tem evitado.
    A fortaleza não elimina o medo, mas impede que ele nos paralise.

4. Adote um Estilo de Vida Mortificado

  • A mortificação não é desprezo do corpo, mas a ordem justa das potências humanas.
  • Tenha disciplina no sono, na alimentação, no uso da palavra.
  • Escolha, às vezes, o que menos agrada (o prato mais simples, o lugar menos cômodo).

5. Estabeleça Metas e Um Plano de Vida

  • São Josemaria Escrivá propunha um plano de vida espiritual e humano:
    • Hora para levantar-se, oração mental, leitura espiritual, exame de consciência.
    • Metas pequenas e concretas no matrimônio: ouvir mais, criticar menos, elogiar de propósito.
    • Planeje como quer reagir diante de situações desafiadoras: com serenidade, com palavras firmes, sem perder a caridade.

6. Persistência no Bem

  • Mesmo quando não vemos resultados imediatos, persista.
  • Como nos diz Padre Francisco Faus, “A constância é irmã gêmea da fortaleza”.
  • Não desanime se cair; levante-se e continue, com humildade.

Um Exemplo Prático Para Esta Semana

Escolha um pequeno ato de fortaleza para exercitar nos próximos dias. Por exemplo:

  • Levantar-se ao toque do despertador, sem procrastinar.
  • Fazer algo que você vem adiando há semanas.
  • Permanecer em silêncio quando quiser retrucar com impaciência.

Ofereça isso a Deus. Peça a Ele a graça de ir além de suas forças naturais. Como nos ensina Santa Teresa d’Ávila, “a fortaleza não está nos braços, mas no coração disposto”.


E você? Já pensou como é possível viver a fortaleza nas pequenas batalhas do dia a dia?
Compartilhe comigo nos comentários ou me escreva. Vou adorar saber como você está cultivando essa virtude na sua vida.

Com carinho,
Queli Rodrigues

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